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 J. Rentes de Carvalho

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MensagemAssunto: J. Rentes de Carvalho   J. Rentes de Carvalho Icon_minitimeQua Fev 04, 2009 6:07 pm

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Um Romance que nos soca o estômago
Livros


J. Rentes de Carvalho Rentes0

Ernestina, a melhor obra de J. Rentes de Carvalho

«Ernestina conta que nessa altura eram ambos ainda tão castos que nunca tinham trocado um beijo, nem um abraço, e como nenhum deles gostava de dança não sabiam sequer que impressão dava o rodopiar num baile apertados um contra o outro.» Parto deste parágrafo inserido na página 96 deste livro para afirmar que o romance Ernestina é casto, rude, sanguíneo, por vezes febril, mas inquestionavelmente belo.

Numa entrevista conduzida por Rui Ângelo Araújo e Carlos Chaves para o extinto «Eito Fora», José Rentes de Carvalho disse:
«Certo é que a qualidade de transmontano a ressinto eu de uma maneira que sensivelmente difere da das gerações mais novas. Porque venho de muito longe. De um Nordeste que nos anos 30 e 40 não tinha luz nem estrada, e tremia ao ver passar o comboio. Onde no modo de vida, na rudeza dos costumes, nas técnicas, nas alfaias da lavoura, pouca mudança tinha havido desde a dominação romana.

Nesse ambiente e nessa maneira de ser enterram-se o que agora se chamam as «raízes.» As minhas. Juntamente com isso, o passado, as vivências, a memória e a sensibilidade impuseram-me uma certa maneira de observar, tornando-me agente passivo, mero espectador. De modo que tenho a impressão de que não sou eu que «lido», antes diria que sou «lidado» pelas circunstâncias da minha origem.»

Por razões várias eu tinha uma necessidade interior de contar essas histórias. Uma dessas razões, talvez a menor, era a de deixar aos meus netos um relato da sua ascendência. Mas com Ernestina o motivo premente foi o de dar voz aos meus antepassados, sobretudo aos meus dois avós, e de deixar um retrato o mais fiel possível de uma época e de um mundo que se perdeu.

Em obra assim a nudez e a crueza são inevitáveis, porque se em parte nenhuma a vida é uma festa, no Trás-os-Montes desse tempo ela era tragédia permanente. Nessa tragédia participei eu, logo desde a tomada de consciência. Mas nenhuma necessidade de catarse me leva a isso, sim o respeito que me merecem os que sofrem sem se poderem defender, os humildes e os humilhados. Está longe de ser fácil mostrar-me a mim e aos meus numa realidade tão crua, mas essa foi a que testemunhei e a que eles sofreram para que eu sofresse menos e me pudesse libertar.»

Muito autobiográfico, sente-se que a estória corre quase sempre no fio da verdade, escrito com uma elegância que só os mestres conseguem, Ernestina é um livro capaz de socar o estômago, fazer rir, e chorar qualquer transmontano com mais de quarenta anos. Atrevam-se a lê-lo e depois digam-me qualquer coisa.


Nota Biográfica

J. Rentes de Carvalho (1930) nasceu em Vila Nova de Gaia, mas os seus ascendentes eram transmontanos de Estevais, Mogadouro. Frequentou os liceus de Viana do Castelo e Vila Real e os cursos de Românicas e Direito em Lisboa, mas viria a abandonar Portugal por razões políticas. Rio de Janeiro, São Paulo, Nova Iorque e Paris, cidades onde trabalhou para jornais e revistas brasileiros, foram os seus portos de abrigo. Amsterdão seguir-se-ia, em 1956, para onde foi como assessor do adido comercial da embaixada do Brasil e onde se licenciou, na Universidade de Amesterdão. Ali foi professor de Literatura Portuguesa desde 1964 até à reforma, em 1988.

Jorge Laiginhas, 2009-02-04
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