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Criança de 11 anos era escrava domésticapor CÉU NEVES
Hoje
Autoridades estão preocupadas com 'servidão doméstica'. Este ano, foi descoberta uma menina moçambicana escravizada.O tráfico de pessoas para a "servidão doméstica" preocupa as autoridades, nacionais e internacionais. É mais invisível do que no caso da exploração sexual ou laboral e as vítimas estão ainda mais vulneráveis. Já este ano, foi detectada em Portugal uma menina moçambicana, de 11 anos, que vivia em regime de escravatura. É um exemplo da nova face do tráfico de seres humanos, que substitui a violência pelo controlo psicológico e tem como alvo os menores.
Foram os técnicos de um centro de saúde que suspeitaram das más condições em que vivia a criança moçambicana e a sinalizaram às autoridades. Tinha sido trazida de Moçambique para fazer os trabalhos domésticos mais duros, vivendo 24 horas fechada e em regime de escravatura. E foi trazida para a casa de uma família da classe alta ou média-alta.
Os responsáveis do Observatório de Tráfico de Seres Humanos (OTSH) confirmam que se trata de "uma situação de escravatura", sem dar mais pormenores, até para proteger a vítima. Mas a sinalização confirma que o fenómeno também existe em Portugal ( há registo de um outro caso).
"É uma nova realidade e é importante chamar a atenção para essa situação. Fala-se muito em exploração sexual, porque é o mais visível - os casos que encontrámos foram na prostituição e em bares - enquanto que as vítimas de servidão doméstica passam 24 horas fechadas e nem os vizinhos se apercebem", explica Joana Wrabetz, presidente do OTSH.
Trata-se de uma nova área de discussão no tráfico de seres humanos e, ainda há 15 dias, a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) organizou um colóquio sobre o tema em Viena, Áustria.
Tem organizado campanhas de sensibilização e um dos alvos são as embaixadas, entidades que gozam de um sistema jurídico próprio, o que dificulta a detecção destas situações em casas dos embaixadores.
E m Portugal, o OTSH vai organizar um workshop em colaboração com o Ministério dos Negócios Estrangeiros para sensibilizar os diplomatas para esta realidade.
Em muitos casos, as vítimas são "recrutadas" ainda menores nos meios pobres e iletrados. Victoria Dochitcu, dirigente da organização internacional de apoio às vítimas de tráfico humano Lastrada, explica que as redes estão a mudar a forma e o alvo de recrutamento. E estão a dirigir-se aos menores que são mais vulneráveis que os adultos.
"As redes estão sempre a encontrar novas formas de actuação. E o tráfico de seres humanos mudou a face. Há uns anos, víamos o tráfico de mulheres para a exploração sexual, a quem retiravam os passaportes e mantinham enclausuradas. Isso mudou. Hoje, exercem um controlo psicológico e as próprias vítimas não se reconhecem como tal. E é muito mais difícil de detectar essas", justifica.
E estão a mudar o alvo. Na Moldávia, onde Victoria dirige a Hotline de Lastrada, "estão a deixar a imigração ilegal para se dedicarem ao tráfico interno, traficando menores para o turismo sexual". E acrescenta: "As vítimas são oriundas de famílias pobres, onde há registos de abusos sexuais, com pais com dependências e alguns emigrados. Crianças que não têm dinheiro, não têm boa comida e roupa e propõem-lhes uma vida melhor. E dizem-lhes que os vão levar para os pais."
A situação é sobretudo grave em alguns países da Europa do Leste, como a Moldávia e a Roménia. Além da exploração sexual, são recrutadas para a prática da mendicidade.
In DN