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As obras megalómanas dos Emirados por Lumena Raposo
Hoje
Em apenas 40 anos, os descendentes dos beduínos e dos pescadores de pérolas do golfo Pérsico transformaram-se em magnatas do petróleo e criaram um país que, após responder às necessidades básicas dos seus cidadãos, aposta agora na área cultural e nas energias renováveis.Mas para que precisam de um Louvre? Podem ir até Paris... A pergunta - embora abusiva - não incomoda Ibrahim Al-Abed no encontro que manteve com alguns jornalistas em Abu Dhabi. O director-geral do Conselho Nacional dos Media dos Emirados Árabes Unidos (EAU) explica, no seu tom de voz calmo mas que não ilude a autoridade de que goza: "Todos devem ter direito a conhecer outras culturas, através da visualização de obras de arte, de livros, etc."
"Não queremos ser apenas um centro comercial ou de produção de petróleo", sublinha Al-Abed, que há muito passou a barreira dos 60, mas que o Governo de Abu Dhabi mantém no activo. E este palestiniano, com passaporte koweitiano mas que os EAU tratam como um dos seus - sentimento que Al-Abed retribui -, avança: "Queremos que as nossas crianças vejam o que fez o fundador do país. Há 35 anos, esta cidade nada tinha, era deserto."
Al-Abed não resiste em fazer o elogio ao xeque Zayed, ao quanto foi visionário e determinado em concretizar o seu sonho. "Há 35 anos, não havia electricidade, água canalizada, as escolas funcionavam sob as árvores, faltavam hospitais. Hoje, tudo isso está ultrapassado, mas não pode ser esquecido". Al-Abed refere-se aos projectos - sempre de grande dimensão - em desenvolvimento nos Emirados, em especial aos que estão em curso na ilha da Felicidade, mas também à construção do maior parque de painéis solares do mundo, isto é, a maior central fotovoltaica. Assim, tudo em grande, como grande é a riqueza do país: é a quarta maior reserva mundial de petróleo, sem falar no gás natural e nas pérolas.
Ibrahim Al-Abed admite que não existem pobres entre os nacionais dos Emirados, porque "pobre é o que tem fome, o sem abrigo, mas há quem tenha necessidades". Necessidades? "Sim, não ter uma casa digna é uma necessidade", explica, sem entrar em pormenores.
Expatriados e imigrantes? (São 80% da população e oriundos do Bangladesh, Paquistão, Índia, Afeganistão, Filipinas). Para Al-Abed, não constituem problema, são quem ajudam a construir o país, o problema "são as redes que trazem os imigrantes ilegais".
Joseph controla os carros que entram e saem do hotel, e não deixa de se surpreender ao ver as duas jornalistas a deixar o edifício a pé. Mas a surpresa fica-se pelo olhar. Joseph é indiano e cristão. Está há dois anos em Abu Dhabi e planeava ir passar o Natal com a família. E então? "Não posso, é muito dinheiro.".São caras as passagens? "Não, não são, mas é preciso dinheiro." E mais não diz.
Existem igrejas cristãs na cidade? Joseph anima-se: "Sim, há duas: a de São José e a de São Francisco, mas para ir a pé fica longe." E de táxi? "Com o trânsito, são 25 minutos para cada lado".
O tempo é escasso: há outro compromisso em breve. Há que voltar as costas à temperatura primaveril da cidade que cresce cada vez mais e regressar à temperatura quase gélida do hotel: os nacionais dos Emirados não conseguem viver sem ar condicionado. Elas defendem-se vestindo as obrigatórias abaias negras, mas as ocidentais tiritam..
(A jornalista viajou a convite do Governo dos EAU)
In DN